O fato de ser filha única entre dois homens não me deu privilégios e tive que construir minha própria história até chegar ao Conselho de Acionistas da Transpes, companhia criada por meu pai e hoje uma das maiores empresas de logística do Brasil. Mas tudo começou com um sapato de salto alto.
Por Tarsia Gonzalez
Em 1982, com 13 anos, eu disse a meu pai que estava crescendo e que as minhas roupas já não eram mais de criança, e que eu tinha muita vontade de comprar um sapato de salto. Eu achava um sapato de salto a coisa mais linda do mundo. A resposta dele foi de que estava na hora de eu trabalhar para que pudesse comprar eu mesma o sapato.
Foi minha mãe que não deixou eu parar de estudar para trabalhar. Mas nesse momento nasceu o desejo e a necessidade de começar a produzir para conquistar as coisas sem precisar pedir a ninguém, sem saber, meu pai havia inspirado em mim uma nova fase. Meu início na empresa aconteceu em 1986, aos 16 anos, quando me tornei sócia-cotista.
Comecei trabalhando alguns dias da semana, fazendo tudo o que era necessário. Organizava os ambientes e, como fazia esta tarefa muito bem, meu pai pediu para que eu executasse a conferência dos relatórios de viagem dos motoristas carreteiros. Eu organizava, somava e lançava no relatório quanto tinha custado aquela viagem. Foi aí que comecei a aprender a calcular o quilômetro rodado, a média do caminhão, quanto aquilo representava de custo e fazer o ressarcimento das despesas, bem como lidar com encrencas, quando surgiam divergências.
Depois de 6 meses de trabalho, honestamente, já havia até esquecido do sapato, ajudar meu pai passou a ser a prioridade, eu me sentia útil e isso me fazia feliz. Hoje tenho paixão por sapatos e, sempre que gosto de um, me recordo dos primeiros pares que tive a oportunidade de comprar por minha conta.
Depois dessa primeira fase, percorreu todas as áreas da empresa, o que me deu um perfil profissional generalista: trabalhei na área financeira e, depois, na área de gestão de pessoas, na época chamada de departamento pessoal e recursos humanos. Em 1998, implementei a certificação ISO 9001 na empresa, na época, a primeira de Minas Gerais e a terceira do Brasil no segmento de transportes a obter o certificado.
Meu caminho foi se desenvolvendo com muitas vitórias: em 2005, contratei uma empresa para desenvolver o planejamento estratégico da Transpes – um dos resultados foi a mudança do nome de Transpesminas para Transpes, passando a empresa a atuar não só em Minas como em todo território nacional; em 2007, implantei na matriz um sistema integrado de gestão empresarial que hoje já está instalado em todas as filiais, inovando a empresa e trazendo controles eficazes para melhores resultados.
Dois anos depois, em 2009, assumi o departamento de Marketing e Comunicação. Mas foi só em 2012, depois que retornar de Madri, um aperfeiçoamento profissional pela ESADE Business School – Alta Performance em Liderança, em parceria com a Fundação Dom Cabral, que executei o projeto mais intenso até então: a governança corporativa, que culminou com a criação do Conselho de Administração da empresa, com a assessoria da Fundação Dom Cabral.
Nessa época, fiz meu primeiro processo sucessório, do meu então cargo de executiva, para assumir, em 2015, como presidente do Conselho, no qual fiquei por seis anos. Agora, aos 54, pronta para novos voos profissionais, realizei a segunda empreitada mais audaciosa da minha vida, o processo sucessório do meu cargo no Conselho Administrativo da companhia, passando o bastão para meu filho Ruz Gonzalez.
Eu sigo no Conselho de Acionistas, honrando a empresa na qual construí minha trajetória. A Transpes, eleita em 2014, 2015 e 2016 uma das Melhores Empresas para se Trabalhar pela revista Você S/A, foi fundada em 1966 com 5 caminhões; hoje, a frota é composta de mais de 1.000 equipamentos. A empresa registra mais de 500 clientes atendidos e, por ano, transporta mais de um milhão de toneladas, faz 25 mil embarques e percorre 30 milhões de quilômetros.